sexta-feira, 21 de junho de 2013

Dívida pública a retalho?


As pradarias estão secas de injustiças várias e de corrupção.

Quando a esmola é grande o pobre desconfia
A bolsa de Lisboa encerrou a sessão e a semana a negociar no vermelho, tal como as principais congéneres europeias, registando a sexta semana de perdas consecutivas. A praça nacional foi a segunda que mais recuou na Europa. O sector energético foi o que mais pressionou no encerramento — in Jornal de Negócios, 21 jun 2013.

O ministro das Finanças revelou hoje, no Luxemburgo, que o Estado planeia dar a possibilidade de subscrição de títulos do Tesouro aos particulares, face ao aumento significativo da poupança das famílias portuguesas — in Jornal de Negócios, 21 jun 2013.

A queda nas bolsas europeias e mundiais é uma consequência direta da última conferência de imprensa dada por Ben Bernanke (Benjamin Shalom Bernanke).

O presidente da Reserva Federal americana anunciou entre dentes que a hemorragia monetária conhecida por Quantitative Easing (através da qual o Tesouro dos EUA aumenta de forma aventureira a quantidade de dólares no mundo, i.e. a sua base monetária) iria possivelmente abrandar.

Ou seja, a liquidez que tem servido aos maiores especuladores do planeta —os quatro super bancos americanos (JPMorgan, Citi, Bank of America, Goldman Sachs), o inglês HSBC e o alemão Deutsche Bank—, e ainda a muitos outros bancos e fundos de investimento especulativo, para alimentar as bolhas imobiliárias em todo o mundo, a bolha estudantil nos Estados Unidos, e a gigantesca bolha das dívidas soberanas, nomeadamente na Europa, ao encolher, ou ameaçar encolher, faz disparar os juros do dinheiro e as rentabilidades esperadas do investimento especulativo — o qual tem tendência a retrair-se e/ou a exigir maiores ganhos.

As bolsas de valores, precisamente por estarem agarradas ao 'crack' Keynesiano da criação fictícia de liquidez, a tal expansão da base monetária (QE nos EUA, LTRO, na Europa, Abenomics no Japão, etc.), começaram a cair no minuto em que Ben Bernanke proferiu estas duas frases contraditórias: “have no fear as the economy is bad enough that the Taper will never come” e “the economy is picking-up and that’s great so we don’t need the Fed anymore”. 

Se a economia não melhorar a monetização da dívida prosseguirá (QEn); mas como a economia está a arrebitar, o que é uma boa notícia, deixaremos de precisar da FED. A esta contradição o mercado reagiu com um colapso bolsista global, enquanto o preço das dívidas soberanas foi subindo em toda a parte, com as consequências dramáticas que se conhecem na Turquia e no Brasil. Entretanto a insolvência da Grécia e de Chipre agravam-se, a situação da Islândia agrava-se, e veremos o que vai ocorrer em Itália, Espanha e Portugal nos próximos meses.

Como é evidente, a subida da Euribor, tal como a subida das yields (rendas) dos títulos de dívida pública dos PIIGS*F*UK*R*US (ver tabela das Obrigações a 10 anos) é um sinal cristalino de que a pressão sobre os governos vai aumentar, a pressão fiscal sobre a riqueza real disponível vai continuar elevada ou mesmo agravar-se, e que, portanto, o discurso sobre o crescimento é uma ilusão ou pura demagogia.

O anúncio de Vítor Gaspar, tornado público hoje no Luxemburgo, sobre a possibilidade de a dívida pública portuguesa passar a ser vendida a retalho, é o reconhecimento disfarçado de que a procura dos grandes especuladores para os títulos da dívida pública portuguesa vai simultaneamente diminuir e exigir maiores rentabilidades ao Estado.

A conversa mole do ministro das finanças é pois uma confissão implícita do fracasso rotundo da sua estratégia no modo como aplicou e não aplicou o Memorando da Troika.

Vêm aí tempos mais difíceis ainda e perigosos. As rendas implícitas da dívida soberana portuguesa a dez anos (10Y) estavam hoje nos 6,42%. A 7%, todo o dinheiro que se obtiver por esta via terá que ser pago a dobrar ao fim de 10 anos, ou seja, na maturidade! É este o verdadeiro garrote que está a levar Portugal para a bancarrota. E é precisamente esta bancarrota que é preciso evitar.

O mais provável é o governo incapaz e cobarde que temos colapsar em breve. É possível que um governo de emergência, anti-crise, de salvação nacional, etc., o venha substituir. Mas a dúvida persiste: serão os partidos que conduziram o país para o buraco, capazes de o tirar de lá?

Curiosidade; os yields da dívida soberana brasileira estão nos 11,75!!!


POST SCRIPTUM — A queda das bolsas na Europa é também consequência da decisão do conselho de ministros europeus das finanças esta Quinta-Feira, 21/6, onde ficou assente que antes de recapitalizar um banco europeu em dificuldades, com fundos do Mecanismo Europeu de Estabilidade [ESM], o banco em causa será sujeito a um 'bail-in' semelhante ao de Chipre! 

The Eurogroup has agreed there will be strict eligibility criteria as well as a clear pecking order for the instrument.

— An appropriate level of bail-in will be applied before the bank is recapitalised by the ESM in line with EU State aid rules, and applying of the forthcoming Bank Recovery and Resolution Directive (BRRD) as of the start of the supervision by the SSM.

— A burden-sharing scheme will determine the contributions of the requesting Member State and the ESM in order to cater for the existence of legacy assets and to ensure that incentives remain aligned between the ESM and the requesting Member State.
— €60bn will be the limit on the volume of possible direct bank recapitalisations.

— Potential retroactive application of the instrument will have to be decided on a case-by-case basis and by mutual agreement. Possible cases will have to be discussed and assessed on their own merits once the instrument enters into force — in Eurozone Portal.
 

António Cerveira Pinto 

Última atualização: 23 jun 2013, 10:26

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